Epistolário Camoniano
Elas incluem, para além das cinco epístolas em prosa tradicionais (VII-X, XII), mais três que são estudadas como epístolas (II, III, XI) e outras três que são reatribuídas a Camões (I, IV e IVa). Para mais duas missivas é estabelecida a autoria camoniana pela primeira vez (Ia, V), enquanto uma última (VI), há muito reconhecida como sendo de Camões, permaneceu inédita em versão integral por quase 100 anos, sendo esta a primeira a vir a público nesta série.
O acervo de informações que as cartas de Camões revelam inclui, por exemplo, a cidade onde ele nasceu; como era a vida militar da guarnição portuguesa de Ceuta onde ele serviu, e as queixas dos portugueses contra o Capitão da praça; quem eram os seus companheiros de má vida na noite lisboeta, e por que razões foi preso em 1552; o impacto da pandemia da sífilis nas letras europeias e portuguesas; ou como se malcomportavam as diversas tribos urbanas que compunham a colónia portuguesa residente em Goa.
No comentário, o mais extenso até hoje elaborado para o epistolário camoniano, estudam-se aspetos que têm sido pouco contemplados, desde os biográficos – já sejam os contornos da sua doença e as circunstâncias exatas da sua morte – aos mais teóricos: a afinidade entre a comédia, a sátira e a epístola pelo elemento dionisíaco que subjaz à sua filosofia de vida e visão do mundo.
O retrato ao vivo que resulta deste assinalável esforço interpretativo não é o de um novo Camões, nem o de um Camões alternativo ao Camões brônzeo ou marmóreo, dito «oficial». Pelo contrário, quem reemerge destas páginas é o Camões mais antigo, o original, ainda humano e talvez demasiado humano, com quem os seus contemporâneos privaram quando ele se achava ainda isento do mito com que os pósteros o iriam depurar e desumanizar.